Iniciamos o ano de 2012. Ano frequentemente presente nos últimos meses
na grande mídia (páginas web, redes sociais, e inclusive nas telas de
cinema), especialmente por conta de supostas profecias que preveriam o
fim do mundo para os seus dias. A esta data se chegou por intermédio de
um complexo emaranhado de conjecturas que levariam a crer que o fim dos
tempos coincidiria com o fim do calendário Maia, ou seja, em dezembro
deste ano.
Afinal, há real motivo para nos preocuparmos?
Em primeiro lugar, há que se dizer que tais supostas profecias não
constituem novidades na história da humanidade. Ao longo dos séculos
foram muitos os pseudoprofetas que alardearam um fim do mundo iminente
gerando grande inquietação entre os mais crédulos. Perderíamos a conta
se fôssemos averiguar quantas vezes o “mundo já acabou”. Na própria
época em que o Senhor estava em carne mortal em meio a nós, já existiam
tais suposições. A resposta de Cristo? “Daquele dia e hora ninguém sabe, nem os anjos que estão no céu, nem o Filho, senão o Pai” (Mc 13,32).
Um cristão não deve se preocupar com estas supostas previsões, pois o
mesmo Senhor, que nos revelou todo o necessário para nossa salvação e
felicidade, quis preservar no mistério de Deus o dia e a hora em que
este mundo teria fim. Como afirma o Catecismo da Igreja Católica (cf. n.
65), em Cristo o Pai nos disse tudo. Não haverá outra revelação além
dessa. E o grande doutor místico espanhol, São João da Cruz, afirmava em
sua “Subida ao Monte Carmelo”: «Ao dar-nos, como nos deu, o seu Filho,
que é a sua Palavra - e não tem outra – [Deus] disse-nos tudo ao mesmo
tempo e de uma só vez nesta Palavra única e já nada mais tem para dizer.
[...] Porque o que antes disse parcialmente pelos profetas, revelou-o
totalmente, dando-nos o Todo que é o seu Filho. E por isso, quem agora
quisesse consultar a Deus ou pedir-Lhe alguma visão ou revelação, não só
cometeria um disparate, mas faria agravo a Deus, por não pôr os olhos
totalmente em Cristo e buscar fora d'Ele outra realidade ou novidade».
O Magistério da Igreja, seguindo os passos de seu Fundador, decretou em
1516, no V Concílio de Latrão: “Mandamos a todos os que estão, ou
futuramente estarão, incumbidos da pregação, que de modo nenhum presumam
afirmar ou apregoar determinado juízo. Com efeito, a Verdade
diz: 'Não toca a vós ter conhecimento dos tempos e momentos que o Pai
fixou por Sua própria autoridade'. Consta que os que até hoje ousaram
afirmar tais coisas mentiram e, por causa deles, não pouco sofreu a
autoridade daqueles que pregam com retidão. Ninguém ouse predizer o
futuro apelando para a Sagrada Escritura, nem afirmar o que quer que
seja, como se o tivesse recebido do Espírito Santo ou de revelação
particular, nem ouse apoiar-se sobre conjecturas vãs ou despropositadas.
Cada qual deve, segundo o preceito divino, pregar o Evangelho a toda
criatura, aprender a detestar o vício, recomendar e ensinar a prática
das virtudes, a paz e a caridade mútua, tão recomendada por nosso
Redentor.”
Sabemos, pela fé, que este mundo não é definitivo, e
cremos, como rezamos frequentemente no Símbolo Apostólico, que o Senhor
voltará glorioso para julgar vivos e mortos. E qual deve ser nossa
atitude enquanto Ele não aparece em Sua glória? É o próprio Senhor quem
nos responde: “Vigiai, pois, porque não sabeis a que hora há de vir o
vosso Senhor” (Mt 24,42). Essa deve ser, portanto, a nossa atitude: a de
espera. É justamente por isso que o fim do mundo jamais deverá
surpreender a um fiel cristão, que não pode temer nem a vida, nem a
morte. Para ele, o fim do mundo não será uma surpresa, pois ele o
espera. Espera ansiosamente o encontro final com o Senhor de sua vida, a
alegria sem fim, fruto da contemplação face a face do Amado de nossas
almas. Os primeiros cristãos, nossos pais na fé, desejavam ardentemente
essa vinda do Senhor ao suplicarem: "Vem, Senhor Jesus!" (cf. Ap 22,20).
A esperança cristã, no entanto, não nos faz desentendermos das coisas
desta terra. Ao contrário, pelo fato de esperamos novos céus e nova
terra, trabalhamos intensamente para estar preparados para este dia.
Diante da consciência de que este mundo - tal qual conhecemos - não
durará para sempre, somos interpelados a aproveitar ao máximo cada
segundo que a paciência de Deus nos concede, para nos convertermos à Sua
santa vontade. Na realização livre dos planos que o Todo-poderoso
sonhou desde sempre para cada um de nós está a nossa felicidade, e, em
definitiva, é só isso o que importa: querer o querer de Deus.
Certa vez os amigos de um jovem santo - dizem que foi São Luiz Gonzaga -
perguntavam entre si o que fariam se soubessem que o mundo acabaria
naquele exato momento. As respostas foram muitas: um buscaria
confessar-se o quanto antes, o outro procuraria reconciliar-se com os
seus familiares, etc. A resposta do santo? “Continuaria jogando, como
estou fazendo agora”. Essa tranquilidade é consequência de saber-se em
cada momento na vontade de Deus. Quem nela está não se preocupa se o
mundo terminará hoje ou amanhã, pois em cada momento está preparado,
esperando ansiosamente o encontro último com seu Senhor.
Padre Demétrio Gomes
Diretor do Instituto Filosófico e Teológico do
Seminário Arquidiocesano São José de Niterói
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